Entrevista ao cozinheiro Luís Portugal

 

 

Tem 43 anos, vive em Bragança, considera-se uma «ave rara» na cozinha e acredita que a melhor cozinha se faz com os nossos produtos tradicionais. A sua paixão pela culinária já vem desde criança, e o Masterchef serviu para divulgar Trás-os-Montes e os seus produtos de excelência. O Clube de Jornalismo da Escola aproveitou um Show Cooking que este grande cozinheiro transmontano veio fazer a Vinhais, no âmbito da Feira da Castanha, e fez-lhe uma entrevista para o conhecermos melhor…

 

Entrevista realizada por: Jorge Ventura, Ana Rita, Ana Sofia e Ana Vitória, do 8ºA.

 

Clube de Jornalismo: Como é que começou a sua ligação à cozinha?

 

Luís Portugal: Olhem, de muito novinho eu nunca gostei de comer muito, mas gostei sempre comer bem. E então, muito novinho, apreciava a minha tia a fazer comida com muita calma e aquilo sabia muito bem e eu comia pouquinho, mas comia. E depois, sempre que via um prato, uma coisa que eu gostava, eu chegava a casa e queria fazer igual, e depois queria fazer melhor que aquele. Foi assim, de uma forma perfeitamente natural, nunca nada de muito comprometido, mas sempre num ambiente muito tranquilo. Acho que a cozinha é um estado de espírito, é aquilo que nos diz que nós estamos bem, ou então que não estamos bem. É por isso que eu  não consigo nunca fazer um prato igual, depende muito do meu ambiente, de como eu me sinto.

C. J.: Qual foi o primeiro prato que cozinhou?

L. P.: Não tenho muito a certeza, mas assim a sério, acho que foi o bacalhau.

C.J.: Dizem que há mil e uma maneiras de fazer bacalhau. Para si, qual é a mais especial?

L. P.: Há mil e uma maneiras de fazer bacalhau e cada fez há mais. Há um bacalhau que eu gosto muito, aliás, eu gosto sempre muito das comidas na brasa… bacalhau na brasa abafado com couve com ovo cozido, broa, alho, pimentão doce, e muito azeite.

C. J.: Quais são os pratos que prefere cozinhar?

L. P.: Não tenho preferências. Eu gosto muito de cozinhar… eu sou apaixonado pela cozinha. Depende muito do dia, mas, acima de tudo, gosto de cozinhar coisas da época. Nesta altura gosto de cozinhar castanhas, cogumelos… depende muito em que altura estamos e onde eu estiver. Se estou à beira do mar gosto muito de fazer peixe. Cheguei há pouco tempo de Paris, de uma das maiores feiras de gastronomia e lá queria fazer trunfas e caviar.

C. J.: Quando cozinha cogumelos também utiliza cogumelos apanhados por si, ou prefere não arriscar?

L. P.: Não arrisco. Ainda não tive o tempo e a disponibilidade necessários para conseguir aprender à séria. E nos cogumelos ou outros alimentos temos duas hipóteses: ou sabemos exatamente o que é que estamos a comer ou então não comemos. Não vale a pena correr riscos.

C. J.: Tem algum prato da sua autoria?

L.P.: Tenho vários. Ainda hoje fiz um prato da minha autoria. Fiz pela primeira vez um puré com vinho, com crocante de castanha. Também nunca tinha feito um belo porco bísaro com mel e ervas de Provence só entalado em azeite. Eu acho que cada prato que eu faço é um prato da minha autoria.

C. J.: Qual é a sua opinião sobre a influência do “fast food” na alimentação das pessoas?

L. P.: É uma pergunta muito difícil para eu responder… Mas eu estou a ensinar - e fico já disponibilizado para fazer na vossa escola também -  as cantinas, já fiz isso em várias escolas, a cozinharem legumes. Os legumes é uma coisa que as crianças adoram, desde que estejam bem cozinhados, no tempo certo, se lhes conseguirmos dar crocante e sabor. Quando houver um “fast food” de castanha e porco bísaro, aí sim,  eu acho que podemos e devemos comer…

C. J.: O que o levou a concorrer ao Masterchef?

L. P.: Eu fui enganado. Foi a minha filha que me inscreveu. Eu nunca tinha visto um programa Masterchef, nem sabia sequer como é que eram as provas, mas, depois de estar lá, com uma grande paixão pela cozinha e, acima de tudo, com uma grande determinação, tudo se consegue. Eu falei 72 vezes em Vinhais. Falei muitas vezes em Trás-os-Montes, e isso foi aquilo pelo que eu lutei e que pensei fazer. Trás-os-Montes é uma região onde existem os produtos mais excelentes do mundo, nos nossos 9 meses de inverno e dos 3 de inferno. Acima de tudo, nós temos também de explicar uma coisa às pessoas das nossas terras que é: devemos pensar em vender as coisas que fazemos nas nossas aldeias muito bem vendidas e a preços muito bons, que nos permitam continuar a fazer coisas de muita qualidade, porque os nossos produtos têm muita qualidade! E, isto, deve ser o princípio do nosso caminho.

C. J.: O que aprendeu com o programa?

L. P.: Aprendi muita coisa. Até aprendi a viver mais em comunidade… aprendi a respeitar e aprendi a cozinhar muito, muito, muito, porque estive 3 meses a cozinhar todos os dias, a ler sobre cozinha todos os dias.

C. J.: Acha que este tipo de programas contribuem para a preservação da cozinha nacional?

L. P.: Não tenho dúvida nenhuma! Enquanto houver gente como o Luís Portugal, que acha que a cozinha típica, a cozinha do pote, também pode ser uma cozinha gourmet, e uma cozinha de qualidade! Eu vou sair daqui agora à pressa e vou vos dar uma novidade, da qual eu também estou muito orgulhoso: vou ser o primeiro não estrela Michelin a fazer um jantar na rota das estrelas Michelin e vou agora sair para Amarante, para a Casa da Calçada,  cozinhar ao pé de 9 ou 10 estrelas Michelin.

C. J.: As outras culturas influenciam o modo como cozinha?

L. P.: Claro que sim. Influenciam sempre, mas há um principio que nós temos que ter: podemos ir para a melhor escola de cozinha do mundo, mas se não sabemos fazer um refogado e como temperamos umas batatas e fazer uma sopa, nunca vamos ser bons cozinheiros.

C. J.: A castanha é uma companheira de trabalho?

L. P.: A castanha é excelente. A castanha dá-nos tudo, dá-nos sopa, puré, castanha frita, castanha assada… e é um excelente acompanhamento para todos os pratos de carne. Já para não falar da doçaria, que é fantástica, a farinha de castanha, por exemplo. A castanha é muito polivalente.

C. J.: Nós lemos uma entrevista sua, onde o chefe se considera uma “ave rara”, pode explicar porquê?

L. P.: Porque sou assim! Olha, precisamente por isto. Por esta forma de eu ser aventureiro como uma “ave rara” e que chegava aqui e pegava nas castanhas misturava-as com vinho de Vinhais e pensava fazer um puré. Nunca tinha feito.

C. J.: Ou seja, é um criativo?

L. P.: Sim, tem que ser muita criatividade na cozinha.

C. J.: E improviso também?

L. P.: Sempre! Aliás, nós temos que improvisar sempre, eu cheguei aqui e não tinha condições, tive que improvisar…

C. J.: Muito obrigada pela sua disponibilidade e colaboração.

L.P.: O prazer foi todo meu. Muito obrigada, também.

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